O calcanhar de Aquiles
- Teodora Parreira
- Sep 23
- 2 min read
Recentemente, terminei o romance "a Canção de Aquiles", obra literária escrita por Madeline Miller, autora contemporânea que se especializa na temática de mitologia grega. Esse livro foi tão monumental e tão profundo que não podia deixar de fazer alguns comentários a seu respeito. O livro é uma releitura da Ilíada, mas sob o ponto de vista de Pátroclo, escrito em primeira pessoa, com o narrador personagem-protagonista, de forma retrospectiva e interna.
A beleza do livro está justamente na tão profunda maneira que Pátroclo ama. Eu digo ama, pois não existe uma palavra que consiga captar a tamanha sensibilidade que esse personagem carrega dentro de si. Ele acompanha "Aristos Achaion", "o melhor dos gregos", em sua jornada de herói, desde a infância incerta até os campos sangrentos de Tróia, sendo, o fio que costura a tão lendária figura que Aquiles foi à vida cotidiana. É como se, ao lado dele, Pátroclo desse estabilidade ao mundo: o mito continua mito, mas ganha a humanidade que se perde nos relatos focados na guerra.
Para Pátroclo, o herói foi muito mais que aquela figura imponente descrita no livro. Ele reconheceria Aquiles na escuridão total, mesmo que seu amado fosse mudo e ele, surdo. Reconheceria em outra vida, em corpos diferentes e em tempos diferentes, e o amaria até que a última estrela no céu se apagasse (Madeline Miller, sua LINDA — fala sério, que descrição é essa?). Aqui, o amor não é só promessa: é modo de permanecer quando tudo ao redor pede esquecimento.
O livro é uma carta do sentimento mais puro e bonito que uma pessoa pode sentir por outra. É a admiração, o cuidado, a tamanha sensação de afeto que faz um poder dar a vida pelo outro, pois a maior dor do mundo seria ser deixado na Terra quando o outro se for. Cada página parece perguntar a nós, leitores, o que vale a glória de ser lembrado por séculos, se não pudermos, antes, amar e sermos amados. Vou ainda mais além: a própria lembrança que a história tem de Aquiles teria sido fruto do amor que Pátroclo tinha, afinal, é quando veste a armadura e se lança ao combate que ele escolhe se sacrificar para impedir que a glória de Aquiles se manche de silêncio, devolvendo ao herói o nome, o ímpeto, o seu objetivo de vida como indíviduo. O que mais me prendeu foi justamente esse contraste entre a kleos (a glória) e a vida comum: Aquiles, cego em provar-se, persegue a fama prometida desde o berço e sacrifica a chance de ser algo além do próprio mito. Pátroclo, ao contrário, conquista aquilo que a glória não sabe nomear: a liberdade de amar sem precisar provar nada a ninguém.
No fim, "a Canção de Aquiles" não é sobre apenas quem foi o melhor dos gregos, mas sobre o que constitui o homem em sua humanidade. Entre destino e escolha, sobra uma certeza bonita e dolorosa: o amor de Pátroclo por Aquiles, que além de dar um nome ao herói, vai revelar seu calcanhar.
Músicas que me passam a vibe do livro: Work Song - Hozier ; Cherry Wine - Hozier.





Lindo texto Te!! ❤️❤️❤️